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Linhas Tortas: EDNA ACABOU DE FALECER

Uma mulher quase franzina, perto dos quarenta anos, muito falante, sempre com o celular na mão tirando foto de tudo à sua volta. Gostava de ser ouvida. Puxava o braço do seu interlocutor e pedia atenção. Nas manifestações em frente ao Quartel General era sempre uma das primeiras a chegar e somente ia embora depois que os últimos “sacudiam a poeira”. Era “patriota roxa”! E adorava o Bolsonaro, mas não gostava que a chamassem de “bolsonarista”. Era “Brasil acima de tudo”. Mandava fotos para todos os seus amigos e parentes que moravam nos EUA. Atualizava tudo, todo dia, pelo WhatsApp. Sabia de cor todos os hinos e canções, desde o Hino Nacional à “Canção da Infantaria”. Se alguém errasse a letra do Hino Nacional dava até briga. O coração abraçava o mundo, dava a sua água para o sedento, trazia lanche e repartia, se alguém não tinha dinheiro para o ônibus, ela dava. Com o tempo decorou o nome de dezenas de pessoas, de algumas sabia até o nome das esposas e filhos, ou maridos e filhos. Para Edna não havia “tempo ruim”. Quantas vezes secou a roupa no corpo depois da chuvarada. Tinha duas bandeiras sempre com ela, a do Brasil e a de Israel, sua descendência. Na sua memória, às vezes, vinha as histórias dos bisavós sobre o “Holocausto”. Chorava quietinha. Aliás, as únicas vezes em que se aquietava num canto eram quando essas lembranças afloravam na sua mente. Depois pulava, dançava, gritava “palavras de ordem” no meio da multidão. Edna quase morreu quando os sonhos dos patriotas “caíram por terra”. Ao final do ano, juntou umas roupas e, ao lado de uma amiga inseparável, pegaram um ônibus rumo a Brasília. Lá ficariam protegidas em frente ao Quartel General do Exército, da mesma maneira como ficaram aqui no Rio de Janeiro. Duas “loucas” pelo Brasil! Porém, veio o fatídico dia “08 de janeiro”. Depois da confusão, ela retornou ao QG e ficou observando. Após um tempo chamou a amiga e disse que iria fugir dali. Sentia que a situação havia perdido o controle. A amiga quis ficar, os militares as protegeriam – pensava. Edna decidiu vir embora, algo no seu instinto a avisava de algum perigo. Saiu no último minuto, quando os ônibus já encostavam por ali. Tirou a camisa amarela e vestiu uma comum, deixou a bandeira do Brasil pendurada num galho de árvore, guardou a bandeira de Israel por dentro da roupa e saiu pelos cantos, sem carregar mais nada, só dinheiro, cartões e documentos. Largou o restante dentro da barraca. Foi direto à rodoviária e pegou o primeiro ônibus que saía de Brasília. Foi para uma cidade próxima e, dali, foi “saltando de cidade em cidade” até chegar ao Rio. Desde essa época, ela chorava dia e noite. A amiga foi presa. Ficou em depressão. Tempos depois, em crise de depressão, se internou em uma UPA e foi diagnosticada com “sepse urinário”, em estado grave, pois as bactérias já estavam atingindo os rins, bexiga e uretra. Mal atendida, não resistiu e faleceu. Edna, guerreira anônima, deu a sua vida ao Brasil, lutando até o último suspiro.

Por: Elias do Brasil / escritor e historiador, membro do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil (IGHMB) e articulista.

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